domingo, 6 de dezembro de 2015

"FANNY E ALEXANDER" DE INGMAR BERGMAN

“Fanny e Alexander”, de Ingmar Bergman
Augusto Pachêco

É dezembro de 1907. Como num conto barroco de Natal, “Fanny e Alexander”, de Ingmar Bergman, é prova concreta de que o cinema, enquanto obra de arte atemporal, é capaz de avalizar a existência de outros mundos, novos modos de entender o homem e Deus. O filme será exibido neste sábado, às 14h30, na Sessão Cult promovida pela ACCPA no Cine Libero Luxardo. A entrada é franca, com debate após a exibição. Realizado em 1982, (ou seja, depois do perturbador “Da Vida de Marionetes”, e antes de “Depois do Ensaio” e “Saraband”), “Fanny e Alexander” concentra as obsessões estéticas e temáticas do cineasta, como o uso do vermelho que estabelece desde o início o jogo lúdico que está por vir, o fascínio pelo teatro de marionetes e a ignorância nada confortável de não saber ao certo o que há depois da vida, depois da morte.
 Na encenação que convoca patrões e empregados em alegre coreografia que celebra o nascimento de Cristo, uma galeria de personagens com nuances já exploradas em outros filmes do cineasta, aqui representados pelos filhos e esposas dos Ekdhal: a paixão pelo teatro por Oscar e Emily, as dívidas e empréstimos eternos de Carl e sua esposa alemã subjugada, e o conveniente triângulo formado Gustav, Alma e Mag.
 O fantasma que toca piano e que parecia ser uma espécie de narrador do conto do terror que se instala depois de 1h de filme, é indiferente aos sangramentos dos castigos do bispo, este então representante de Deus na Terra, com irmãs e serviçais de rostos duros. Para Bergman, só o poder da imaginação para enfrentar a prisão do bispo Eduard, a severidade que oprime em nome da religião, e tortura psicológica e física como relação de poder. Para Alexander, deixar a infância é deixar de acreditar em anjos, fadas, contos góticos e brinquedos óticos que reproduzem imagens.
 “Fanny e Alexander” pode ser filme sobre a perda da inocência, mas também sobre o poder da magia, do ilusionismo, do amor outonal para toda vida em Isak e Helena. Uma declaração de amor ao teatro através da janela do cinema, como na leitura de “O Sonho”, de August Strindberg, em que sonho e realidade se confundem.

 *jornalista, mestre em Cinema e Literatura e membro da ACCPA – Associação de Críticos de Cinema do Pará.

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