domingo, 3 de novembro de 2013
" A BELA QUE DORME"
A jovem italiana Eluana Englaro foi acidentada e passou 17 anos em coma. Lutou-se pela eutanásia, ou seja, o direito de seus familiares liberarem o desligamento dos aparelhos que a mantinham viva. Uma luta que o cinema já focalizou a exemplo do excelente “Mar Adentro” (2004) de Alejandro Amenábar. Mas o diretor Marco Bellocchio (“De Punhos Cerrados, 1965”) foi demais abrangente no seu “A Bela que Dorme” (La Bella Addormentata, Itália, 2012) ora em cartaz por aqui. Utilizou-se do documental e da ficção. Focalizou não só o caso de Eluana como também 3 outros, detendo-se no da jovem que a mãe, uma artista muito religiosa estava à espera de um final feliz para sua filha comatosa (contra um dos filhos que desejava “libertar a irmã”), o de um senador liberal obrigado pelo partido a votar contra a morte assistida (embora em seu passado escondesse um ato de eutanásia da esposa que pedia, no leito de hospital para morrer), e o de uma jovem usuária de drogas que tenta suicidar-se sendo impedida pelo médico avesso à eutanásia. Ao tentar, na segunda vez esse gesto a jovem suicida retém o impulso preferindo uma segunda chance.
O caso de uma pessoa com morte cerebral foi abordado pelo parlamento italiano com a veemente condenação à situação da eutanásia a pacientes terminais (o filme apresenta uma sequencia de documentário televisivo em que se observa a opinião do então Ministro Silvio Berlusconi). Um mural sobre um tema sempre instigante (eutanasia e morte assistida) poderia funcionar desde que se dirigisse a um estudo das próprias contradições em torno. Por exemplo: o senador que é a favor da eutanasia, mas tem que votar contra, numa imposição partidária, contrapondo-se à opinião de sua filha, católica fervorosa, que por sua vez se relaciona a um colega combatente pelo direito do doente em optar pela morte. O que se vê no filme é uma amostragem de casos sem que o roteiro (do diretor e mais Verônica Raimo e Stefano Rulli) adentre pelo problema focalizado seja dos pontos de vista social ou religioso desses dois tipos de morte. Pende entre as opiniões dos favoráveis e dos contrários à morte dos doentes terminais, o que não quer dizer muito (ou nada) sobre o motivo da tomada de posição diante do assunto e de como a ciência e a espiritualidade veem o/s caso/s.
Do “Caso Eluana” restam cenas de velas e flores colocadas pelos populares no muro do hospital onde a jovem está internada (e morre ao serem os aparelhos desligados). É um contraponto para discutir a eutanásia noutros parâmetros, opção não explorada a contento por Bellochhio. Haveria um enfoque mais profundo sobre os jovens céticos e os religiosos como o padre que leva os sacramentos à moribunda sendo expulso do quarto da paciente, pelo médico. O que parece interessar, talvez, pelo desempenho do sempre correto Toni Servillo, é o caso do tipo que representa (o senador), de comportamento aparentemente paradoxal entre votar contra algo que já viveu anos antes. E nesse ponto há um momento muito bom dele encontrando a filha na estação ferroviária e ela pedindo para ler o discurso a ser proferido por ele no senado contra a opinião da maioria que se mostrava a apoiar a proibição de desligar aparelhos para deixar morrer certos pacientes (quando acontece o óbito de Eluana e ele não precisa usar o que pretendia em plenário). Este homem teme a reação da garota por suas palavras que se chocam com o modo de pensar que ela tem, amparada na religião. Não é possivel conhecer mais a fundo a reação da personagem em sua totalidade, como expressão também dos outros casos apresentados. O filme tenta jogar os argumentos para a plateia “decidir”, mas nada disso possui substância bastante para mudar conceito determinado por parte do espectador. O cineasta não prega uma conciliação entre partidários e contrários ao que se tem como “direito de morrer” e também não se toca no caso de Ramon Sanpedro que foi a base do argumento do filme de Amenábar chance de um desempenho excelente de Javier Bardem.
“A Bela que Dorme” ganhou 5 prêmios internacionais incluindo o de melhor diretor no Festival de Veneza. Bellochio esteve bem melhor em “Vincere”(2009) sobre Benito Mussolini, chegado por aqui só em DVD.(Luzia Álvares)
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