sexta-feira, 10 de maio de 2013

"NUVEM 9" ESTREIA NO CINEMA OLYMPIA

Ao que consta, o cinéfilo paraense está vivendo momentos de descobertas da cinematografia internacional. Vejam-se os recentes filmes exibidos no Cine Olympia (com o aval da ACCPA), no “Líbero Luxardo” e em outros espaços dessa linha para avaliar que se trata de um momento esplêndido do chamado “cinema extra” (como intitulamos esse itinerário há mais de trinta anos, na então APCC). A vez da indicação dessa linha de filmes é para "Nuvem 9”(Wolke Neun/Alemanha, 2008). Trata de um casal de idosos, há 30 anos unido, que aos poucos vê diluir essa norma de convivência quando a esposa, uma costureira de pequenos consertos, ao entregar um trabalho a um freguês contumaz, apaixona-se por este, poucos anos mais novo do que seu marido (mesmo assim na casa dos setenta anos). Depois de vários encontros ela não sabe o que fazer, mas decide ir morar com o namorado mesmo sabendo que o antigo companheiro ficará sozinho em casa, pois a única filha visita a mãe e o padrasto esporadicamente. “Nuvem 9" é um impacto. Na exibição em Paris alguns espectadores se escandalizaram e deixaram a sala de projeção. Mas a critica exaltou o filme, que recebeu 8 prêmios incluindo no Festival de Cannes (“Um Certain Regard”). E as plateias cultas o prestigiaram internacionalmente. Afinal, poucas vezes o cinema se aventurou a um tema tão difícil, ou tão raro. Comparando com “Amor”(Amour) de Michael Haneke, aqui não é o casal de idade avançada que se cuida quando um deles adoece e morre. No enfoque, é um rompimento espontâneo, um caso de desejo, sexualidade e pulsão que espanta a quem pensa que esses sentimentos terminam quando o ser humano chega a certa idade. Ursula Wener, aos 69 anos (fará 70 em setembro), tem um dos mais intensos desempenhos que vi em cinema. Protagoniza Inge, a pacata costureira de ocasião, convivendo com Werner (Horst Rehberg) que está num momento de buscas, não hesita em abandonar o marido pelo solteiro Karl (Horst Whestphal). O relacionamento extraconjugal começa numa das visitas profissionais à casa do fregues, ao entregar-lhe uma calça, implicando em um momento de sexo. Daí a relação toma impulso para vários outros encontros. Ao saber do fato, o marido não a despreza. Mas ela deseja o outro. E este desejo não requer explicação do roteiro do diretor Andrea Dresen e mais Jorg Haushild, Leila Stieler e Cooki Ziesche. “-Isto aconteceu” diz ela ao marido. E não importa como ele receba a noticia da esposa. Sentindo-se culpada, a mãe não hesita em procurar a filha para confidente, que se mostra compreensiva, mas pede que a mãe silencie. Werner, silenciosamente amarga a solidão entre baforadas de cigarro e assistindo, de sua janela, o que mais gosta de fazer: o trem passar por perto de sua casa (ele que é apaixonado por viagens sem rumo). E Inge, se olhando no espelho, sentindo o peso do tempo, mas sem esmorecer. O filme não conclui em um prisma de pretenso moralismo. O “aconteceu” é tratado como um fato possível, e Inge vai viver com Karl. O destino de Werner só ele mesmo decide, mas não insinua uma apoteose. O desamado perde a vontade de viver e não se tenha isso como uma apologia ao suicídio. Ninguém sabe como ficou ou terminou o ancião que achava muito forte o laço de união com a mulher que conheceu no passado já distante. A câmera é tão discreta e “voyeurista” quanto a de Michael Haneke em “Amor”. Quando o casal ou um dos casados sai de um aposento, o enquadramento permanece e se vê os moveis e a parede em demora de alguns segundos. A casa de Inge e Werner é observada quase sempre em silencio e não denuncia qualquer inovação formal. Em outro momento, o apartamento de Karl está em mudança. Ele prepara aposento para Inge. E a mobilidade da câmera é evidente. Ali há vida nova mesmo que os habitantes desse espaço não sejam novos. Mas tudo seria supérfluo sem a atuação de um magnifico elenco e de uma câmera que traduz exemplarmente os elementos que captura pelos significantes. A direção é impecável e indaga-se sobre cineastas criativos cujas obras não ciirculam em países como o nosso (especialmente em nosso estado). “Nuvem 9” é um exemplo de cinema adulto e criativo. Não assistí-lo (estará no Olympia a partir desta sexta feira 10/05 ) é perder um dos excelentes programas deste ano.(Luzia Álvares)

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