sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

"OS MISERÁVEIS"

O prestigio do cineasta Tom Hooper depois do filme britânico “O Discurso do Rei”(2010) levou-o à redescoberta do clássico romance do escritor francês Victor Hugo, “Os Miseráveis” (Les Miserables, publicado em 1862), várias vezes filmado. Hooper não apenas se dignou a realizar mais uma versão do drama de Jean Valjean, o homem que na Paris do século XIX rouba um pão, é condenado e posto em liberdade e perseguido, daí em diante, pelo policial Javert, uma perseguição logo transformada numa obsessão. Hooper foi buscar no musical da Broadway, de Alain Boublil com roteiro de William Nicholson a partir da obra de Claude-Michel Scönberg, afinal quem levou a obra ao teatro. Mais ainda: Hooper não usou dublagem empregando vozes de cantores de opera. Colocou os próprios atores para cantar, gravando na hora da filmagem. A ousadia fez com que Russel Crowe, famoso pelo seu desempenho em “Gladiador”(2000) e outros filmes de ação, assumisse o papel de Javert e cantasse a sua gana na perseguição a Valjean, encarnado e cantado por Hugh Jackman (de “Gigantes de Aço” e os dois exemplares de “X-Men”). “Os Miseráveis” (UK, 2012) ganhou mais de duas horas e meia na tela e ousou inserir no texto original francês alguns momentos, como um confronto de espadas entre o policial e o perseguido. Mas essa liberdade ficcional sobre um livro famoso que leva o filme ao patamar da critica possivelmente está no gênero em que foi baseada esta nova versão do filme, extraida de uma peça musical. Sabe-se que o livro original é composto de cinco volumes, cada um deles priorizando um personagem que circulou na epopéia entre Valjean e Javert – Fantine, Cosete, Marius, a epopéia das barricadas e, finalmente, Jean Valjean. Desse grande painel do século XIX segue-se a crítica à miséria e a pobreza desses personagens. Possivelmente a extração de um ou outro episódio privilegiado no musical tenha favorecido os demais que os leitores de uma parte do livro de Vitor Hugo desconheçam. Quando este foi escrito, a meta foi justamente a miséria e a ausência de liberdade (vale dizer de justiça). Contam que a inspiração foi uma palavra escrita com sangue numa parede. O certo é que embora se possa pensar que “Os Miseráveis” não parece ser alvo ideal para um show da Broadway como se fez com “O Fantasma da Ópera”, ele foi sucesso por lá, daí a significação ao ser adaptado para o cinema. A platéia que aprecia opera e opereta deve ter estranhado a opção pelo musical sem cantores profissionais (vale dizer sem vozes marcantes), havendo uma escravidão da câmera à marcação teatral, evidenciando-se uma direção de arte de alto custo e belisima e uma fotografia (de Danny Cohen) a ressaltar nos tons, a época da ação. No cinema, depois de ilustres edições, esperava-se a utilização da moderna tecnologia para enfatizar o drama do pobre Valjean que mesmo galgando altos postos na vida é alvo de perseguição de uma falange legal que se mostra insensível (ou capaz de dar margem ao papel de defesa). Hooper quis inovar e seguir a linha da peça musical. E a julgar pelas candidaturas ao Oscar, este ano, parece que atingiu seu alvo. O filme é mais um incisivo diferencial nas atuais candidaturas ao mais conhecido prêmio da indústria cinematográfica. Há qualidades no filme e a mostração do desempenho dos concorrentes, carece um olhar apurado, por exemplo, quando a câmera focaliza Anne Hathaway como a pobre e doente Fantine, em close, chorando (e cantando) a sua desdita. Como o Oscar é uma “feira de amostra” sem dúvida na celebração dessa premiação há lugar para Hugh Jackman, candidato a melhor ator, ao lado de Daniel Day Lewis, o melhor Lincoln do cinema. Um desempenho esquecido nessa categoria foi a de Jean Louis Trintignant, em “Amour”. E até Bem Afleck como diretor do tão favorito “Argo”. As razões da indústria, somente a lógica do preço vai ser uma referência ímpar. E nós, que optamos pelas palmas estéticas nem sempre ficamos satisfeitos e continuamos não entendendo a lógica da academia.(Luzia Álvares)

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