terça-feira, 29 de janeiro de 2013

"AMOR" DE MICHAEL HANEKE


Marco Antonio Moreira
Michael Haneke é um diretor habituado em filmar temas polêmicos e desta vez, o tema de seu novo filme não poderia ser mais complexo : o amor. Através deste tema, Haneke fez várias perguntas que surgem com a construção da sua história. O que é o amor para dois velhos solitários que moram sozinhos, vivendo uma vida com/sem sentido, amantes da música e da vida? O que é o amor neste casal até quando estão sãos e bem de saúde e o que é o amor quando um deles sofre um problema cerebral e lentamente vai perdendo o controle da sua vida e fica cada vez mais dependente do outro? “Amor” é um filme sobre a solidão, o tempo, a velhice e sobre como todos estes elementos mudam passo a passo o nosso conceito de tudo o que sabemos ou pensamos saber da vida. Haneke não nos mostra estas questões de forma romanceada, leve. Ele coloca uma narrativa dura, seca, às vezes distante do drama dos personagens para evitar a emoção exagerada e muitas vezes ele consegue, outras não. É difícil não se envolver com o drama deste casal em busca de vida numa idade que só resta a diária reconstrução do que é saber viver e do que é o amor. Afinal, seja qual for o conceito de amor, de amar, ser testemunha do fim gradual e lento do parceiro muda tudo e novas provas de amor merecem/devem surgir. Redescobrir como amar perto do fim, da morte. É possível? Que prova de amor maior pode ser oferecida?Matar, morrer? É possível lutar contra a impotência do fim? “Amor” em cada sequência nos faz pensar nestas reflexões. Otimista, amargo, esperançoso ou pessimista, é uma obra de arte que veio para nos provocar. “Amor” é o cinema forte de Michael Haneke chegando e polemizando mais também é o filme de dois grandes atores em atuações históricas: Emanuelle Riva e Jean-Louis Trintignant. Veja sem falta.

Luzia Álvares
Solidão, geração, complacência, amor. Essas quatro palavras se entrecruzam e se transformam em um símbolo do afeto de alguém pelo outro, numa relação que expõe a condição humana, segundo Michael Haneke, em seu filme “Amour” (2012).Um casal de idosos cujas alegrias compartilhadas construiram um cotidiano digno entre a profissão pública e o ambiente privado familiar é apresentado no filme nos estertores dessa dimensão que favoreceu os dias vividos criando hábitos salutares na composição de uma relação ambiente amigável e plena de ganhos pessoais e profissionais. O emblema proposto é a prisão do casal em uma condição de irreversibilidade diante da doença, e a impotência de um retorno aos velhos hábitos, ao considerar, a partir daí, a transformação que vai se dar entre eles. A bofetada no rosto da esposa inerte que lhe cospe e vomita reflete o sintoma da condição humana. Não somos infalíveis nem santos, mesmo diante de quem amamos até a morte

Pedro Veriano
O novo filme de Michael Hanek vai ao âmago da sentença que o casal pronuncia ao casar: “até que a morte nos separe”. E começa com a forma dramática dessa afirmativa: Anne (Emanuelle Riva) está morta. O amor que dedica ao marido George (Jean Louis Trintignant)é demonstrado em detalhes que se vê desde que eles,músicos profissionais, assistem a um concerto. A única filha (Isabelle Huppert) também é ligada à musica. Mas ela pouco aparece na tela. O que mais se vê, além de marido e mulher vivendo seus mais de 80 anos, é o apartamento luxuoso em que moram em Paris. A câmera, quase sempre estática, descobre as paredes, os moveis tudo em grandes planos para dimensionar a relação do espaço físico com as figuras humanas. Anne sofre uma isquemia cerebral na hora em que ela e o marido são vistos em médio plano diante de uma mesa. A conversa que travam é interrompida pela falta de respostas por parte dela. Daí se passa para a lenta deterioração de seu corpo. E para o desvelo (e desespero) do marido dedicado. Cenas de grande intensidade dramática fecham o enfoque. Há uma sequencia em que um pombo invade o apartamento e George tenta tirá-lo dali sem sucesso. Uma alusão poética. Mas o filme acaba defendendo a eutanásia como forma de amor, embora não deixe no espectador a imagem exclusiva de uma dedicação mórbida demonstrada por grandes intérpretes. Os últimos planos são livres, retratando uma volta à vida, como se as pessoas em espírito prosseguissem as suas jornadas.Afinal, diz Hanek, o verdadeiro amor é imortal.

Arnaldo Prado Junior
Logo que terminei de assistir Amor (Amour, França / Alemanha / Áustria, 2012) não tinha uma referência básica para interpretar a tragédia de Anne (Emmanuelle Riva) e Georges (Jean-Louis Trintignant). A ação física, o cessar a vida por um processo mecânico, aplicado por George em Anne, quebrou violentamente toda a racionalidade que ele apresentou ao longo da enfermidade da mulher. Enfocar o anoitecer da vida e, mais, com uma doença progressiva com degeneração mental sem esperança de recuperação, foi o que fez Michael Haneke com a participação de dois excelentes atores que, certamente escolhidos, encontram-se na faixa de idade dos próprios personagens. Resultou uma obra sensível, humana, sentimental, triste, esteticamente consistente para não dizer irrepreensível. A realidade por trás da ficção é contundente, levou ao desespero que atingiu os personagens, mas que deve ser evitado.O final é enigmático. Anne está terminando de arrumar a louça na pia, fala para Georges que, se ele quiser, pode calçar os sapatos, o que ele faz. Terminada a tarefa ela pega um casaco que ele ajuda a vestir; ela agradece e encaminha-se para a porta de saída da casa. Ele a segue, mas antes de sair pergunta se ele não vai pegar o casaco; ele volta, pega o casaco, veste-o, encaminha-se para a saída, a luz é apagada. Ele sai, fechando a porta. Tudo normal, nada de trágico aconteceu, foi apenas um delírio, um pesadelo. Ainda há uma cena com a filha deles entrando na casa vazia, passa pelos compartimentos, senta-se em uma poltrona, fica à espera.

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