quarta-feira, 3 de outubro de 2012

"IRACEMA: UMA TRANSA AMAZÔNICA" NA SESSÃO ACCPA/SARAIVA DIA 04/12


Uma india a margem do progresso Filme que conta com a paraense Edna de Cássia como protagonista continua sendo vigoroso no mundo atual. O ano era 1974. O slogan, "Pra Frente Brasil". O progresso estava ali, virando a esquina. A amazônia era a última fronteira e talvez a mais importante para os militares que reinavam no país. E eis que então, dois jovens realizadores - Orlando Senna e Jorge Bodanzky - ousaram mais do que deviam e fizeram um filme único, reconhecido mundo afora como um dos maiores exemplos da vigorosa cinematografia brasileira.
 "Iracema - Uma Transa Amazônica", o filme em questão, é citado como referência por nomes como Hector Babenco, Alfonso Cuarón e Fernando Meirelles. Mas o que tem de tal especial essa obra, que ficou sob o julgo da censura durante anos? Tudo tornou-se realidade em outubro de 74, quando meia dúzia de pessoas saía de São Paulo dentro de uma Kombi com destino a Belém. Além de Orlando e Jorge, o produtor Wolf Gauer e outros três integrantes da equipe de filmagem do road movie. Na sinopse, o caminhoneiro Tião Brasil Grande (Paulo Cesar Pereio) vai à Região Norte do país, onde conhece Iracema (Edna de Cássia), uma índia prostituída. Juntos percorrem a região amazônica, cenário da expansão da rodovia Transamazônica, usada como propaganda do governo da ditadura militar. No caminho, interagem com moradores e observam os problemas provocados pela estrada, que, em vez do progresso prometido, trouxe desmatamento, queimadas, trabalho escravo e prostituição infantil para a região.
Cinefilo de carteirinha, o pesquisador e historiador Jorge Ramos possui um projeto que discorre sobre a nossa filmografia e aponta essa obra como visionária. "Iracema foi proibido pela ditadura e salvo pelo cineclube Tarumã, da Universidade do Amazonas, para ser exibido nos difíceis anos de 1970, num Brasil cujo lema estampa o para-brisa do caminhão de Tião – ‘ame-o ou deixe-o’", contou. Numa verdadeira 'expedição' rumo ao desconhecido, o grupo pouco conhecia a região e por imaginar que o trânsito não seria fácil, trabalhou apenas uma câmera Eclair muito leve, uma lente zoom, um tripé, negativos em 16 mm e algumas lâmpadas. Cerca de 40 dias depois, estava de volta. À medida que as filmagens se desenrolavam, os negativos eram enviados para a Alemanha - mais precisamente para a sede da ZDF, emissora pública de TV que financiava a empreitada. Em dezembro daquele ano, a versão final de Iracema ficou pronta. O longa de 90 minutos se atrevia a retratar um fenômeno raríssimas vezes abordado na época: a devastação da floresta amazônica. A ousadia fez com que o governo militar o proibisse no país até 1980. Mas isso não impediu que a obra corresse o mundo e se tornasse uma lenda. Mesmo no Brasil, cinéfilos conseguiam vê-la em sessões clandestinas na casa de Bodanzky e em alguns cineclubes.
 Muito por conta dessa proposta revolucionária de temática, a estetica jogou a favor da liberdade autoral e este foi um dos primeiros filmes a ser classificados como ficção/documentário. "Iracema e Tião Brasil grande nos desvendam uma Amazônia que ainda vive se não aqueles mesmos problemas, então as suas consequências. "Iracema" é documentário porque denuncia e é ficção porque é metáfora, porque é diagnóstico. É cinema", decreta Ramos.
CÍRIO
Belém, como não poderia deixar de ser, serviu como locação desse obra seminal. A pequena equipe cinematgográfica cobriu a grande procissão do Círio de Nossa Senhora de Nazaré, onde, misturada à multidão, Iracema é a protagonista da saga de tantas mulheres paraenses tragadas pelo sistema que subjulga os mais pobres. Recém chegada do Marajó, Iracema está no genese para se tornar prostituta, mas tem fé num futuro melhor, indo na corda como romeira, perdida na maré de rostos, dores e esperanças. E assim, o filme que tinha tudo para não ser feito se tornou um clássico cultuado. "Iracema" foi, como Jorge frisou, proibido no Brasil por anos. Foi exibido pela primeira vez no país no Festival de Brasília de 1980, onde ganhou quatro prêmios, incluindo o de melhor filme e logo tornou-se premiado no exterior e um baluarte do cinema sem amarras nem fronteiras.

SERVIÇO:
Sessão ACCPA/Saraiva apresenta “Iracema - Uma Transa Amazônica”, de Jorge Bodanzky e Orlando Senna. Nesta quinta, 04, às 19h, no espaço Benedito Nunes da Livraria Saraiva ((Boulevard Shopping, 2º piso). Entrada Franca.
Após o filme, debate entre o público e membros da Associação de Críticos de Cinema do Pará, com a participação do historiador Jorge Ramos.
(Lorenna Montenegro)

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