quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

O CINEMA SOBRE CINEMA

George Mèliés morreu em 1938 como morrem muitos gênios: na merda. A magia do cinema que ele levou ao pé da letra fazendo filmes de truques, ou mágicos (ele era mágico e empresário de mágico) simplesmente o esqueceu. Penso melhor: nos seus primórdios o cinema não era levado a sério. O público suspirava por uma Pola Negri ou ria de Chaplin mas pouco se dava que David Griffith mexia a câmera, aproximava-a dos olhares das estrelas e/ou Eisenstein fazia da propaganda encomendada uma obra de arte. Nunca se cultuava um filme como um quadro ou um livro. E nem precisa ir muito longe: nas diversas modalidades artísticas nem sempre se chegou a louvar seus autores quando ainda transitavam neste mundo.
O filme “A Invenção de Hugo Cabret” coloca Mèliés no trono a que fazia jus e jamais sentou. Mas a ficção o tira do ostracismo e leva-o a esse trono. Tudo através da idéia de um Selznick, membro da família do produtor de cinema que fez “...E O Vento Levou”(e o bando de gente que dirigiu o filme foi sob ordens rigorosas dele) e patrocinou “Rebeca”,trazendo Hitchcock de sua Londres para Hollywood, e mandou na RKO por algum tempo. Este roteirista de agora, Brian Selznick, deu chance a Martin Scorsese de fazer cinema sobre cinema em grande estilo. Scorsese, quem é cinéfilo sabe, é doido por esta arte de fabricar sonhos (se bem que tenha feito filmes de pretensão realista com excesso de violência). É o grande restaurador de peliculas nos dias de hoje. E quando leu o livro de Selznick não hesitou em pagar para ver na tela grande. E pensou certo: Mèliés adoraria filmar em 3D, realçando seus truques. Fez “A Invenção de Hugo Cabret”(Hugo)nessa técnica que exumou uma das muitas investidas da industria cinematográfica contra a televisão nos idos de 1950. Convocou seus auxiliares doutros carnavais, Dante Ferretti e Francesca Lo Schiavo para desenhar a Paris “belle époque” que serviria de palco às aventuras do garoto órfão o Hugo do titulo, não percorrendo salões litero-musicais como fez Woody Allen na sua meia noite parisiense, mas no ponto em que poderia encontrar o autor de “Voyage dans la lune”(1902) e acabasse por conseguir que se desse a ele em vida a homenagem que fazia jus.
O filme é uma beleza para a vista e o coração. Emocionou-me. Até porque eu vejo cinema assim, como o fabricante de sonhos, a arte de se decolar desse mundo e se correr por espaços totalmente irreais, um coquetel de idéias/imagens onde a gente se sinta (bem ou nem tanto).
Curioso é que “Hugo”(nome original) chega no ano de “O Artista” outro filme sobre a infância da industria cinematográfica. Os dois são candidatos a Oscar: “Hugo” a onze, “Artista” a dez. Se perderem para coisas como “Descendente” eu sinceramente, vou deixar de ver essa festa pela TV daqui em diante. Mesmo que se tratem os prêmios de Hollywood como peças de indústria para indústria os primórdios dessa mesma indústria em obras excelentes merecem o reconhecimento e jamais venham a ser preteridas por melodramas que abençoem os cornos com a cara de George Clooney.(Pedro Veriano)

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