sábado, 28 de fevereiro de 2009

DESPERTAR AMARGO

O sonho americano, um presente de Morfeu ao governo Roosevelt na época do New Deal, hoje é desacatado pela geração Prozac, ou Valium, ou um sonífero mais forte. Para cineastas como o inglês Sam Mendes, sonhar só a peso de barbiturico, e nesta vida de violências recíprocas (marido e mulher vivem numa arena disputando cetros de pesos diversos), o melhor será usar o despertador, ou ingerir o lendário Pervitin, pílula largamente consumida pelos estudantes de 50 anos atrás.
“Foi Apenas um Sonho” (Revolutionary Road) é um pesadelo vivido por um casal da classe média nos anos 50. O filme começa quando ele e ela se conhecem, e vai até ao pico de uma crise onde um dos dois forçosamente desaparece. Não é uma intriga policial a terminar com um crime engendrado pelo marido ou pela mulher. É um longo papo sobre desencontros, das pequenas coisas ao trabalho de um e de outro, ele empregado numa firma que detesta (até porque o pai nunca subiu de posto nessa firma), ela uma atriz que se deu mal e nunca mais pisou num palco.
O casal pensa em fugir. Ela planeja uma viagem a Paris com ele deixando o emprego e ela se empregando num escritório americano na capital francesa. Seria a formula para cada um aprender a gostar da vida. Mas ele não se maldiz, até porque é adultero. E ela é forçada, em determinado momento, a traí-lo. Os dois têm um casal de filhos e espera um terceiro. A guerra paira sobre este feto que amadurece.
Ninguém faz mais filmes como “Lar Meu Tormento” ou qualquer outra comédia interpretada por Gary Grant. O que era sonho, hoje parece piada. O livro de Richard Yates de onde veio o filme de Mendes, descrê de uma união perene, da monogamia, da compreensão à base da licença que uma pessoa dá a outra, perdendo e ganhando para manter o quadro de uma igualdade de desiguais. E o diretor, marido da atriz Kate Winslet, gosta desse caos ou desse “amargo despertar”(nome de filme). Ele havia feito antes “Beleza Americana”, um quadro ainda pior da sociedade estadunidense.
O que vale no filme atual são os atores. Leonardo DiCaprio e Kate Winslet estão irrepreensíveis nos papeis que exigem uma certa postura teatral (Mendes é diretor de teatro). Mas não se diga que teatralizam os papeis. Defendem bem suas posturas e falas. O diabo é que tudo está a serviço de um pessimismo doentio. No fim, uma das mulheres massacradas pela estereotipagem fala da casa onde moraram as figuras centrais da história (ela sevia de corretora) e o marido, prudentemente, desliga o seu aparelho auditivo. Fosse um filme mais corajoso e se desligaria a câmera. Dá vontade.(Pedro Veriano)

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